domingo, 5 de setembro de 2010

E a luz virá da cadeia

Almiro Zago

Dia desses, sentado à mesa de janela num restaurante, estava eu a ganhar calorias, enquanto diversas pessoas tratavam de perder a suas numa academia, no outro lado da rua.

Perto de mim, num grupinho, o assunto do almoço era a calamitosa situação dos presídios, a promiscuidade e a ociosidade dos presos. Tive  ímpetos, contidos a tempo, mas libertos agora, de a eles apontar  original alternativa para amenizar o problema: levar academias de ginástica aos reclusos, dando-lhes a chance de malhar.

Intimamente, divertia-me com o achado, e ao notar um sujeito que pedalava num aparelho, bolei uma academia equipada só com bicicletas estacionárias, providas de  dínamo, mas sem  farol.

Se alguém esqueceu, ou não sabe,  dínamo, eu pesquisei,  é um pequeno aparelho que gera corrente contínua convertendo energia mecânica em elétrica, através de indução eletromagnética.

Algum tempo depois, em madrugada de insônia,  surpreendi-me a imaginar  os encarcerados pedalando para manter a forma física e produzindo  energia elétrica.

Não seria uma coisa  bacana? Veríamos aí, ao mesmo tempo, a realização do ideal romano - “mens sana in corpore sano”, mente sã em corpo sadio - e toda a massa carcerária com possibilidade de ocupação útil, remunerada e, ainda, com direito à remição da pena pelo trabalho.

Está bem, podem dizer que seja bobagem, mas confesso minha irresistível simpatia   pela ideia.

Afinal, pouco custa pensar em  novo jeito de lidar com  tema tão explosivo.  Depois, uma reflexão isenta nos revelaria a sociedade refletida nas imagens das casas prisionais   pela  incúria, leviandade,  indiferença  para com o lado mais dramático da imperfeição humana,  inseparável  da convivência em comunidade. E tanto maior quanto mais doente o tecido social.

Convenhamos, nesse quadro gris, um projeto como este, por quixotesco que pareça,  mais interessante será  do que a inércia e a ausente criatividade. Depois,  para a sua adoção, mais não reclamaria do que a  vontade política dos agentes estatais, mesmo  diante da sempre alegada carestia de recursos.

Pois não andam a falar de parcerias? Estão aí as  empresas distribuidoras de energia elétrica, que bem poderiam construir instalações junto a presídios e penitenciárias e equipá-las para funcionamento das, digamos, academias, verdadeiras  mini usinas de   propulsão humana.

Claro, haveria   problemas técnicos a resolver, o que, entretanto, não demandaria maior cota de massa cinzenta  a dois ou três engenheiros das áreas  envolvidas.

Vejam só: num presídio com quatro centenas de homens, cada um exercitando-se 30 minutos por dia, ter-se-ia 200 horas diárias de produção de energia elétrica. Se o dínamo de uma bicicleta comum gera luz suficiente para iluminar o caminho noturno de um ciclista, pode-se bem ter uma noção do que representariam 400 faróis.

De minha parte,  devidamente citada a fonte, daria de graça a ideia, o que não significa renúncia a eventuais recompensas em moeda corrente nacional.

Mas quanto ao exercício físico dos reclusos, anotem bem a ressalva: pedalar fortalece a  musculatura das pernas. Aí, se eles fugirem, quem os alcançará?
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