terça-feira, 26 de julho de 2011

Do Colisor de Hádrons à armadilha de chulé

Almiro Zago

Se existe o bilionário projeto do CERN, o Conselho Europeu para a Pesquisa Nuclear, aquele do Colisor de Hádrons dos cientistas com fixação nas origens do universo e na identificação do Bóson de Higgs, aqui na planície vemos pesquisas sustentadas por módicos recursos fazendo ciência com resultados, por que não?, mais proveitosos para a humanidade do presente. 

Li na internet, dias passados, uma das manchetes mais interessantes deste século: Armadilha de chulé combate mosquito da malária. Vejam só, quem de nós teria imaginado semelhante coisa?

Soube que um jovem pesquisador da Tanzânia, baseado na demonstração do holandês Bart Knols de que o odor dos pés é atrativo para as moscas, desenvolveu uma armadilha de chulé'artificial com substâncias venenosas. Sua força de atração do mosquito propagador da malária, num raio de 110 m, é quatro vezes maior do que outros meios. 

Nem se pense que seja pouca coisa, pois o trabalho mereceu reconhecimento da Fundação Bill e Melinda Gates e da Grand Challenge Canada. E o prêmio concedido, 775 mil dólares, vai permitir a continuidade dos estudos pelo Instituto de Saúde de Ifakara, na Tanzânia, liderados pelo pesquisador Fredros Okumu, nome que promete.

Dizem que a inovação africana significará grande avanço na erradicação da malária, que anualmente acomete, no mundo, 220 milhões de pessoas, das quais morrem 800 mil, principalmente pobres e crianças.

Mas há outro genial projeto de pesquisa, embora nem tão pobre. É aquele da Fundação Gates investindo 42 milhões de dólares para que desenvolvedores reinventem o vaso sanitário, acabando com o desperdício de água. Até onde sei, a busca seria por inovações na captura e armazenamento de dejetos humanos e na criação de maneiras de processá-los em energia e fertilizantes.

Por outro lado, confesso minhas implicâncias com a turma do CERN, porque, entre outros pontos, enquanto a Terra vai perdendo condições de vida e milhões de seus habitantes padecem de fome e doenças, pesquisadores com rico patrocínio só pensam em desvendar como o universo começou.

Dito isso, torço para que muito antes dos cientistas do Colisor de Hádrons encontrarem o Bóson de Higgs — se bem entendi, a matéria que deveria estar dentro do núcleo do átomo —, seus colegas mais modestos encontrem solução ecológica para o que vai dentro do vaso sanitário. E também estaremos mais protegidos da malária graças ao chulé, o artificial, claro.  

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Chateações sem fim

Almiro Zago

Ao assunto minorias e seus direitos, de uns tempos para cá, não tem faltado cobertura, exposição na mídia. Mas é pelas silenciosas e sem voz que vou falar. Pensando bem, seriam subminorias das minorias, e aquelas minorias inseridas no corpo das maiorias. Coisa complicada? Acho bom deixar para os sociólogos e outros estudiosos a tarefa de clarear o tema.

Resigno-me aqui, a expor pequenos dramas, que passariam por bobagens, não fosse sua permanência que leva chateação a não pouca gente. Por exemplo, pessoas com alguma deficiência visual, ainda que usem correção, e integrantes da faixa etária, por muitos chamada de “melhor idade”, embora seja desconhecida a opinião dos velhinhos a respeito.

Chateação I:

Para começo, meu caso. Desconheço medo de andar de elevador, o que não me poupa de um princípio de pânico ao procurar pelo painel de controle. Certo, ele termina por aparecer com seu belo design, mas... a cor dos botões e números confundem-se com a cor da placa metálica onde estão inseridos. E na pressa, pois há gente em volta, arrisco torcer o pescoço movimentando a cabeça para cima, para baixo, para os lados até ajustar a lente dos óculos ao ponto procurado. 

Ah, e se precisar manter a porta aberta, qual botão premer?

Já notaram como são as indicações nas teclas? Por mais que suba e desça de ascensor, não consigo me livrar do esforço para focar o objeto, até concluir que aquela tecla — com as curtíssimas, quase invisíveis, setas que se encontram — serve para evitar que a porta se feche. Bem, a essa altura ela já se fechou, e foi-se a gentileza para alguém que se aproximava.

Sim, conheço elevadores em que o dito painel exibe com clareza os botões dos andares, mas se necessito saber qual deles permite aquela operação de abrir ou cerrar a porta, haja acuidade visual para chegar às microscópicas setas indicativas!
 
Sabem a causa de tudo? A insensibilidade de designers e fabricantes que nos privam da praticidade em favor da estética, a deusa deles. Ainda virá o dia em que, pela Internet, será convocado colossal protesto, tipo paralisação geral de elevadores, contra tamanho descaso.

Chateação II:

E há outras coisas, em semelhante linha, que vêm exaurindo a paciência, na cidade onde vivo, embora o mesmo aconteça em outros lugares, também. Sair pelas ruas de carro à procura de um determinado endereço vira trabalho para Sherlock Holmes, acreditem. As plaquetas com os números dos prédios, além de pequenas, estão sempre escondidas nos pontos mais “criativos” das edificações, exatamente para não serem descobertas. Nem vou falar das placas com os nomes das ruas, pois quando existem já é um sucesso.

 Chateação III:

Por fim, meu nome pode ser encontrado na lista gris da sofredora minoria vítima da ditadura do gelo. Entre nós, todas as bebidas, tudo tem de ser gelado. E quando se tem vias respiratórias superiores e o chamado aparelho fonador de relações estremecidas com o frio dos líquidos, dos sorvetes, é preciso ficar na defensiva, pois, nessa área, a solidariedade é pouco conhecida.

Para dar pequena ideia, o primeiro aborrecimento, num restaurante e similares, começa com a necessidade de pedir enfática e claramente, por exemplo, “uma água mineral, sem gás, fora do gelo”. É um ganho quando o garçom, ou mesmo o dono do estabelecimento entende o pedido. E frequentemente não tem o que se pede. Depois, nas temporadas de calor, olham para a gente como se vissem um extraterrestre. “Imaginem só, o sujeito não toma água gelada...”

Em viagens, tudo se complica por causa dos hábitos locais. Certa feita, aconselharam-me a pedir, no idioma do país, que a bebida seja servida na temperatura ambiente. Tem dado certo, mas uma exceção houve. Num almoço, pedi vinho tinto, insistindo naquela ressalva.

E, rigorosamente, assim foi servido.

Porém, a temperatura ambiente era a do Passo Pordoi, nos Alpes italianos, a menos de três graus Celsius...

                                                                    * * *