Almiro
Zago
Nunca
antes na História estiveram os seres humanos diante de maior expectativa de
vida do que neste século, inclusive e especialmente nós brasileiros.
Mas
(ah, esse mas...), paradoxalmente, também nunca antes em nosso País, e talvez
pelo mundo afora, guerras à parte, a vida tenha valido tão pouco, como pouco
valendo está no contexto duma cada vez mais vasta faixa populacional de índole
criminosa com assustadora gama de matizes. Matam por nada, matam por pouco,
matam por muito, matam com frieza, crueldade e revoltante indiferença pela vida
alheia.
E os
órgãos estatais e suas insuficientes estruturas vão ao difícil enfrentamento munidos
com o Direito Penal moderno. Já no meu íntimo, nos momentos de incontida
indignação com a barbárie, bate a ideia de que o Código de Hamurábi, rei da
Suméria, aquele do “olho por olho, dente por dente”, também não bastaria para
dissuasão desses criminosos com um pé na fronteira da civilização e, outro, na
Idade da Pedra Lascada.
Pois
ainda que vivamos nesse clima apreensivo, mostram as estatísticas oficiais a
auspiciosa expansão da expectativa de
vida do brasileiro, tendo ganho um acréscimo de 25,4 anos, entre 1960 e 2010. E
com tendência crescente.
Agora,
mesmo diante desses dados positivos, sinto assomar à mente esta dura e triste reflexão
sobre o que a realidade, diariamente, nos joga na cara: a perspectiva de
longevidade sendo roubada de muitos brasileiros por obra de mãos
assassinas.
E,
dizem os registros, grande parte dessas vítimas nem bem chegaram a viver o
começo da primeira juventude.
Depois,
de frustrada esperança de vida e de longa vida, chegamos aos tantos e tantos de
nossos irmãos que têm encontrado a morte entre destroços retorcidos de veículos
de todos os tipos, ao longo de estradas ou em ruas e avenidas das cidades.
Ao
amanhecer das segundas-feiras ou ao final dos feriadões, o noticiário de rádio,
que ouço, mais parece produzido por correspondentes de guerra, tamanha a
mortandade por conta de acidentes de circulação.
A
causa? Negligência ou imprudência ou imperícia ao volante, frequentemente em
associação com a ausência de juízo de muitos motoristas, aqueles que tolhem a
vida de pessoas que nada têm a ver com suas loucuras, particularmente crianças.
E, ironicamente,
logo no tempo de um livro chamado “Carta a um menino que viverá 100 anos”. Seu autor, o geneticista italiano Edoardo
Boncinelli, escreve com muito conhecimento sobre a ciência moderna e as
implicações dos novos experimentos
sobre a vida artificial e às mais recentes descobertas da genética, onde se
inclui o rejuvenescimento de partes do corpo, a cura de doenças tidas como
letais, tudo levando à longevidade humana.
Receio
nem conseguir imaginar a dor dos afetos — pais, avós, irmãos das crianças e
jovens levados à morte pela violência de criminosos ou do trânsito — se acaso
chegar a “Carta a um menino que viverá 100 anos”, sem jamais encontrar o
destinatário.
Contudo,
contrariando o poeta*, viver é preciso.
***
*Fernando
Pessoa