Almiro Zago
Em tempos de Internet, celulares, tablets e afins, a espionagem
voa à velocidade da luz. Em rasantes captura infinidades de dados e informações
sobre tudo e todos, de governos, governantes e governados, de empresas. Se a privacidade foi ao espaço, o espião
pós-moderno deletou o fascínio do antecessor que empolgava escritores de
romances policiais e roteiristas de cinema. Em contrapartida, a sua fantástica
ação vem rendendo sérios problemas ao seu patrão. Por enquanto, os Estados
Unidos. E olhem que nem os amigos de Obama escaparam da bisbilhotice eletrônica
deles.
Ao que sei, a Presidenta Dilma foi a primeira vítima a estrilar, usando
a ONU como caixa de ressonância das denúncias de violação de privacidade de
pessoas e órgãos estatais.
Viu-se, depois, na TV, nos jornais, nas redes sociais, a forte
contrariedade de François Hollande e Angela Merkel, igualmente ofendidos pela
indevida coleta de dados pessoais e dos seus governos pela turma da N.S.A. Itália
e Espanha também não ficaram de fora.
Notem bem, aqueles dirigentes políticos foram espionados a
distância e nem sabem exatamente o que viram os espiões. Sem dúvida, os cremes
de beleza de Dilma e Merkel não foram tocados, nem seus objetos de uso pessoal.
Tampouco Hollande teve reviradas suas cuecas e gravatas.
Mas comigo, tudo foi diferente, nada virtual. Abriram minha mala no
domingo 15 de setembro, no aeroporto JFK, em Nova York, enquanto esperava
embarcar para o Brasil. Só notei ao chegar em casa, ainda bem.
A minha querida e surrada mala vermelha, de tantas lembranças, foi
revistada. Ao contrário de Hollande, Merkel e Dilma, estou sozinho, apenas com esta
voz de locutor aposentado, sem mídia para repercutir minha indignação.
Mala de viagem, é para mim uma espécie de resumo do meu quarto que
me acompanha aonde vou.
Ao perceber que o cadeado fora sacado, afastei os fechos com o
espanto de quem encontra a própria casa de portas abertas pelos ladrões. E aí deu-se a conhecer a sensação de ultraje,
como se visse mãos estranhas revolvendo minha roupa, a limpa e a suja. E tocar
na minha roupa suja é como devassar minha intimidade.
Menos mal que os agentes revelaram experiência no ramo, pois deixaram
tudo arrumado, salvo os carregadores do barbeador e do celular.
Se Dilma, Merkel e Hollande ouviram vazias explicações de
embaixadores, os meus espiões deixaram confissão escrita, em forma de aviso
impresso em inglês e espanhol. O papelucho diz que eles têm permissão legal para
busca de produtos proibidos em bagagens. Ah, sim, a finalidade era a de
proteger a mim e aos demais passageiros do meu voo.
Meus olhos, que já iam umedecendo, num
instante secaram ao ler que tiveram de inutilizar o cadeado – e não se
responsabilizam pelo dano – porque só fazem isso quando a mala está trancada...
Dizem que viajar é cultura e aprendizado. Nessa
ida a Nova York aprendi uma lição: não se tranca mala de viagem.
Claro, para facilitar o trabalho deles. Já
os ladrões de aeroporto agradecem.
27.10.2013