domingo, 30 de outubro de 2011

De livros e sabiás cantores


Almiro Zago

57ª Feira do Livro de Porto Alegre: patrona Jane Tutikian
28 de outubro a 15 de novembro

Por que nossos jovens não leem?

As razões do desapego dos jovens pela leitura poderiam ser listadas facilmente se ficássemos  na superficialidade, no aparente. E isso pouco ajuda.

Mas pensando bem, se o estímulo à leitura é o objetivo, o que de bom e proveitoso posso fazer agora,  além de participar da Feira do Livro,  seria repercutir  o que disse a escritora Jane Tutikian sobre o tema. Está registrado  no Caderno de Cultura, de Zero Hora, na edição de sábado, 22 de outubro:

Perguntou o jornal: “Que atividade a senhora gostaria de fazer como patrona que poderia marcar seu período à frente da Feira?”

Bem, em resposta, a escritora Jane Tutikian  lançou desconcertante diagnóstico e um desafio inquietante:

“A primeira coisa que eu gostaria de fazer seria uma grande campanha de formação do leitor. Nos queixamos muito de que nossos jovens não leem e nos escondemos atrás de mil desculpas. As principais são a TV e a internet, e enquanto nos omitimos, as coisas continuam como estão. A escola diz que quem forma o leitor é a família. Como forma, se a família não lê? Mesmo os mais abastados, já dizia o Pedro Bandeira, preferem investir nos pés das crianças e não na cabeça. Compram tênis caríssimos, mas não compram livros. A família diz que quem forma é a escola. Como, se os professores não leem? Se literatura é paixão e se é impossível transmitir paixão pelo que não se conhece? A segunda é levar escritores para conversar com escritores, no fim de tarde, de volta à praça.”
                     
Ao que parece, diante do conhecimento do mal e de suas causas originárias, passaria a solução  pelo trabalho harmonioso, combinado entre família e escola. Porém, em nossa realidade, ambas  carecem de maior presença do elemento fundamental: o livro.

Quem sabe, a campanha de formação do leitor da escritora Jane Tutikian  possa incluir a dotação de todas as escolas, públicas e privadas, com bibliotecas dignas deste nome. Só assim – com livros para todos - será possível enfrentar o desafio de levar os professores a lerem, ou lerem mais.

E o passar aos estudantes a paixão  pelo encanto de ler aconteceria como  natural consequência, não acham?


Outra Feira do Livro, a de Sobradinho

A diretora de cultura da Casa da Cultura de  Sobradinho, Clélia Redin, mandou  convite para participar da 17ª Feira do Livro, que tem como patrono o escritor João Marcos Adede Y Castro.

Sua  programação envolverá os dias 4, 5 e 6, de novembro,  na  Praça 3 de dezembro,  daquela cidade. Entre os destaques da Feira aparece o lançamento do livro “2ª Coletânea do Concurso Literário jornalista Valacir Cremonese”.


O leitor e o fascínio pelos sabiás 

Para minha satisfação, agora escrevo para agradecer mensagens recebidas, via e-mail, de  leitores que revelaram suas ligações de alegria e afeto com os sabiás cantores das madrugadas.

O Lívio Paulo Susin conta da sinfonia diária dos sabiás na Praça La Hire Guerra, em frente, em Porto Alegre. Em Jaraguá do Sul, o Irineu Bianchi curte a cantoria do passaredo ao entardecer. E o Elmo Fiegenbaum, temporariamente em Ribeirão Preto-SP,  manda parabéns pela crônica.

Mas a   Suely Britto, de Porto Alegre, escreve: “Juntando o texto da “Era da desobediência" e dos sábias... eles,  com um cérebro tão pequenino, nem precisam se preparar para considerar suas ações sobre seus iguais. É, precisamos aprender — ainda muito — com a natureza e tudo o mais que nos rodeia.”

Por sua vez a  Jacira Lhullier, também de Porto Alegre,  esteve preocupada com a demora dos pássaros cantarem em seu bairro enquanto faziam festa em outros pontos da capital. Entretanto, conta: “Na primeira madrugada, a do dia 10 de setembro, os amados sabiás me despertaram com sua esperada, desejada e invejada serenata. Que alegria! Acordei meu marido para que também escutasse.”

Já o Osvaldo Ferreira tem vínculos mais próximos e fortes com as aves. No seu  quintal, em Caxias, entre o arvoredo,  instalou  quatro comedores, onde serve, diariamente,  aos mais variados pássaros, canjiquinha, bananas, mamões e pãezinhos amolecidos em água. Completando a mordomia, construiu uma fonte de pedra, onde jorra água  para eles beberem e se banharem em fartos refestelos.

Segundo o Osvaldo, deve ser em retribuição e agradecimento pelo trato recebido que  os sabiás ensaiam a serenata diária, a partir   das três da madrugada. Ah, e um deles tomou o hábito de exibir seus dotes canoros, àquelas horas, na  sacada da casa. 

Bom, a esta altura, embora não seja ornitólogo, nem mesmo um ornitófilo — aquele que se dedica por prazer à ornitologia, li no dicionário —, devo esclarecer que temos falado acerca dos sabiás-laranjeira, pois existem dezenas de espécies dessa ave pertencente à família dos turdídeos.

Com tantos admiradores  desses pássaros, quem sabe saia uma ONG “Amigos dos Sabiás”. Todavia, fique claro,  nada de convênios com órgãos públicos...
                                   

  
P.S:
“Mínimas Confissões” na Feira do Livro:
Banca da Livraria do Maneco

Ou pelos sites:
www.letraevida.com.br 
www.maneco.com.br
www.livrariacultura.com.br

sábado, 8 de outubro de 2011

Seriam os sabiás seres mitológicos?


Almiro Zago
                                                                                                                                                                                         

Quando em tempo de primavera, volto pra casa depois de curtas ou longas ausências, um dos meus primeiros desejos é escutar os sabiás madrugadores, aqui, em plena cidade grande de Porto Alegre. Não, palmeiras por perto nem há, como na Canção do Exílio de Gonçalves Dias. Mas, entre os arvoredos das ruas e do parque, despontam tipuanas grandiosas e, de seus ramos, os sabiás — em solos, duetos, trios, sextetos e, quando não, em grande coral improvisado — inundam a atmosfera com seu canto belo e enternecedor. Os sabiás não me acordam, mas, nas madrugadas, a cumplicidade do meu subconsciente dispara um despertador para que possa ouvi-los. E se a insônia se instala, fazem os pássaros um fundo musical para os meus pensamentos divagantes.

Dizem que é através de seus cantares, como fossem Eros, deus do amor, que os sabiás encontram suas amadas.  Consumada a conquista e iniciada a vida a dois — deve ser isso — os cantores silenciam nos estertores da estação primaveril.

Pois, então, os sabiás cantam por amor, como de amor foi o beijo de Eros a reanimar Psiquê, uma das três Graças, divindades da beleza, na mitologia grega, que moram no monte Olimpo, na companhia das Musas, com as quais, às vezes, formam coros. E fazem parte do séquito de Apolo, o deus músico. 

Seriam os sabiás seres mitológicos perdidos mundo afora?

Ao que se sabe, esses pássaros amorosos ainda estão a esperar homenagem em bronze ou pedra, mas Eros e Psiquê, há tempo, foram imortalizados pelo cinzel mágico do grande escultor neoclássico, Antônio Canova (1757-1822), italiano do Vêneto.
Quem for ao Museu do Louvre, em Paris, terá a chance de encantar-se diante do conjunto em mármore branco, que pertence às alegorias mitológicas da produção canoviana.

Conta-se que Psiquê, vítima de um embuste com o qual Eros, também chamado de Amor e Cupido, estava implicado, abriu uma caixa e, em vez de encontrar a beleza divina, deparou-se com o infernal e verdadeiro sono estígio que dela se apossou e a fez cair no meio do caminho, como um cadáver, sem sentidos e movimentos. E a escultura representa o arrependido Eros no momento em que, ainda com as asas levantadas, chega para reanimar Psiquê com seu beijo.   

Em mármore branco, de superfície polida, torneada com apurado esmero, forma, segundo os entendidos, uma obra de extraordinária articulação. Esculpindo Amor e Psiquê com tanta delicadeza e elegância, Canova revelou grande paixão, como já o fizera em as Três Graças, integrante do acervo do Museu Hermitage, em São Petersburgo.

Isso explica a razão da verdadeira romaria de admiradores de sua obra no Louvre, mesmo na vizinhança de Michelangelo.


quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A era da desobediência


Almiro Zago

Vivemos tempos de desobediência. A começar pelo clima, pelo tempo que vem frustrando nossas expectativas, que andou mandando frio intenso, continuado. E muita chuva para uns, pouca ou nada para outros. E ventos raivantes para todos.

Com a natureza, outra coisa não a há fazer senão o contínuo aprendizado de convivência com ela, devotando-lhe amor e respeito, como devem fazer os bons hóspedes.  Mas não é bem assim que agimos.

Já na sociedade em que vivemos, suscetível de mudanças pela vontade do grupo, dos indivíduos, o proceder de muitos vai tornando difícil o conviver pacífico e respeitoso, democrático e republicano, para usar um termo em voga.

Bem observando, veremos que a desobediência, em graus e formas diversas, é quase generalizada. Nas condutas previstas no Código Penal mostra-se assustadora a quantidade de delinquentes, a audácia e a constância na prática de atos antissociais de gravidade contra as pessoas, contra o patrimônio, contra a administração pública e o erário. Quanto a este, e em preocupante frequência, por quem deveria protegê-lo.

Como se essa criminalidade fosse pouco, vicejam desobediências a preceitos elementares entre a população, no que tange ao respeito ao outro nas simples relações do dia a dia, em atitudes que partem da descortesia e avolumam-se até a grossura. É gente das várias faixas etárias e, se aparência tanto não engana, das diversas camadas sociais, de alto a baixo. O outro... nada conta.

No trânsito, por exemplo, muitos motoristas e outros tantos pedestres revezam-se na inobservância voluntária das simples regras de proceder nas vias públicas.

O sinal vermelho, cada vez mais, vem sendo relativizado em perigoso proceder que poderá levar o trânsito ao caos. E a vida, o que vale?

Para que as coisas funcionem a contento e todos possam exercer seus direitos, a parte de cada um deve ser espontaneamente feita. Isto é fator fundamental da qualidade de vida de qualquer lugar e ajuda a fazer mais felizes as pessoas. 

Há poucos dias, li no blog www.cerebronosso.bio.br/guia-basico-de-neurociencia, a cargo da equipe da neurocientista Suzana Herculano-Houzel, uma interessante lição sobre a vida social, e por isso a compartilho com os meus caros leitores:

“O que é bom para você não é necessariamente bom para os seus vizinhos. Portanto, para conviver em grupo de maneira harmoniosa (o que traz uma série de vantagens a qualquer espécie) é preciso que cada indivíduo seja capaz de levar os demais em consideração — ou seja, de organizar seu comportamento contando com uma avaliação prévia de como os outros serão afetados por ele, ou antecipando por exemplo o que os outros esperam que aconteça. Levar os outros em consideração ao organizar o próprio comportamento é possível graças a algumas capacidades do cérebro.”

Pois, se a criminalidade que nos atormenta escapa ao nosso controle, será que nós — da parte sadia (?) da sociedade — não poderíamos, ao menos, olhar melhor uns aos outros?

Bem, cérebro já temos, o que é um belo começo.

                                                          ****

P.S: Agradeço os amáveis comentários dos leitores Sílvio Teixeira e Carlos P. Anschau relativos ao texto anterior.