Almiro Zago
Teria
chegado ao século 21 o culto dos deuses, como acontecia entre os gregos, os
romanos e outros povos antigos?
Bem
gostaria de conhecer respostas mais convincentes do que minhas especulações.
Por isso, acredito que, amanhã ou depois, ainda veremos o já demorado interesse
de pesquisa sobre as divindades pós-modernas por parte do mundo acadêmico. Se
pudesse, já marcaria lugar na fila dos autógrafos das teses de mestrado ou
doutorado, transformadas em livros, pois elas, de forma científica,
elucidariam, não o mistério da Santíssima Trindade, mas a coexistência do Deus
uno com certo trio divino. Na atualidade, pode crer.
Talvez
mais não seja do que coisa de faxada, mas a crença num Deus único, propagada
pelo Cristianismo, Judaísmo, Islamismo, anda convivendo com o politeísmo. Nem
se fale de pura imaginação, pois o que se observa é a maioria dos crentes a
render homenagens ao Criador, conforme a Bíblia, e, sem conflitos perceptíveis,
a outros deuses venerar, inclusive com a adesão do segmento formado por ateus
esquecidos da incredulidade.
Goza
de séculos de reverência a mais poderosa das divindades a que me refiro, tanto
que na Grécia antiga era conhecida como Pluto, segundo revela certa comédia de
Aristófanes. Certamente, o leitor já sabia chamar-se Dinheiro esse deus afanosamente
cultuado em toda parte. Todavia, são os Bancos os seus santuários.
Promíscuo,
Dinheiro, unindo-se às deusas Ambição e Ganância, gerou outros deuses. O mais
recente leva por nome Consumismo e vem sendo idolatrado das banquinhas de beira
de estrada aos shopping centers, as suas suntuosas catedrais.
Depois
de levar as pessoas a tomarem o supérfluo pelo essencial, seu feito mais
notável acontece no mês de dezembro de todos os anos. Em adoração quase unânime
e com a ingênua cumplicidade do Velhinho do trenó, o deus Consumismo
apropria-se da festa de aniversário de Jesus, o Filho do Deus, dos monoteístas.
E paira sobre tudo e todos.
Fechando
a tríade originária da divindade Dinheiro, veio o deus Automóvel cujos crentes
são arrebanhados num processo sem volta. A entrega inicia-se pela satisfação da
necessidade de locomoção rápida e confortável. Em sequência, os apelos aparecem
carregados de conceitos de prazer, status e luxo; grandeza, velocidade e poder,
sempre ligados ao ideal de beleza, de linhas que apaixonam e fascinam.
É
de seu trono resplandescente, rodeado de cortesãs, que o deus Automóvel
contempla a extensão do seu reino sobre todos os fusos horários. Governos
disputam a localização de suas fábricas de onde jorra enorme quantidade de
exemplares, de tecnologia cada vez mais avançada. Seu destino, as ruas e as
estradas; seu resultado, a inviabilização do trânsito e a poluição do ar.
Desse
caos anunciado, todos sabem e pagam para ver, pois o deus insaciável exigiu,
como tributo à sua glória, a entrega da sensatez de todas as cabeças pensantes
no altar dos sacrifícios.
Embora
o fim dos tempos ainda não seja, já respira por aparelhos a mobilidade urbana,
porém, antes de seu final, ninguém quer deixar a festa.
***
P.S:
Por favor, não me mandem presentes de Natal...
Dezembro
2012
2 comentários:
Olá Almiro!
meu presente não será nenhun automóvel e muito menos um souvenir. e sim, grandes elogios a tua bela crônica da qual também conpartilho todo o conteúdo e bem colocadas idéias.
abraço do Américo.
Américo, como presente de Natal, recebo teu comentário. Fico contente de saber que compartilhamos o conteúdo e as ideias expostos na crônica.
Um abraço.
Almiro
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