Ruínas da Biblioteca de Celso, em Éfeso, Turquia
Se existe uma coisa que eu não possa imaginar é viver sem leitura. Ler livros, jornais, revistas, ou publicações eletrônicas, e isso nem novidade é, fortalece a contínua ligação com a vida, com o mundo exterior. Pensando bem, ler não seria um ato de liberdade, de independência?
Sem distinção de gênero literário, parece-me seja o livro o que mais fascina e encanta o leitor. Seu imaginário o leva a visitar gentes e paisagens desconhecidas e a descobertas, como a de Fernando Pessoa: "Descobri que a leitura é uma forma servil de sonhar. Se tenho de sonhar, porque não sonhar os meus próprios sonhos?"
Freqüentemente, ouve-se falar da solidão, infelicidade de muita gente. Porém, o amante da leitura desse mal não padece. E, também, entende que "é preferível e muito mais enaltecedora uma solidão povoada de lembranças do que uma promiscuidade física opaca e insignificante, ouvindo palavras vazias, inúteis", segundo Delmino Gritti, no ensaio "O futuro do passado".
Por ser o livro, certamente, o mais amado meio de levar cultura e transmitir idéias, de emocionar e cultivar a sensibilidade das pessoas, sempre se fala em estímulo à leitura, da importância de ler, de facilitar o acesso do povo ao livro. E há quem o faça de maneira muito original, como o poeta Sérgio Vaz, em São Paulo, com o sarau semanal de poesia da Cooperativa Cultural da Periferia, no Bar do Zé Batidão, inclusive com distribuição de livros. Foi o que li na crônica do escritor Ricardo Silvestrin, ZH 4/12/08, que participou de um desses encontros.
Em nosso País, de baixos e humilhantes índices de leitura, vemos muita gente de elevado grau de escolaridade e boas condições econômicas sem afeição pela leitura. Para consolo, encontramos outras pessoas determinadas a ler e que lêem, a despeito de sua parca instrução e limitados recursos. E existem, asseguro, pois em menos de dois meses conheci três desses leitores, como vou contar.
Surpreendi-me, certo dia, em plena cozinha de casa a conversar sobre livros e o gosto pela leitura com a senhora que, na ocasião, prestava serviços domésticos. Contou-me de suas preferências literárias e, inclusive, de já ter lido quase toda a série "As Brumas de Avalon", de Marion Zimmer Bradley. Além disso, vem cuidando de passar aos filhos o amor pelo livro.
Depois, ainda em minha casa, um jovem eletricista cuidava de solucionar problemas de iluminação. Por mero acaso, passei perto dele com um exemplar de "Uma temporada no inferno". E, surpreso, ouvi : "Ah, o senhor está lendo Arthur Rimbaud? Espontâneo, revelou-me razoável lista de livros já lidos e a ler, atento a um futuro vestibular assinalado em seus planos.
Todavia, a surpresa mais fascinante por mim esperava na tarde de inauguração da 54ª Feira do Livro de Porto Alegre. Na Praça da Alfândega, sentei-me numa banca de engraxate, onde era de uma mulher o trabalho de passar graxa e lustrar os sapatos. Puxando conversa, perguntei-lhe se a Feira trazia mais clientes.
- Ao contrário, - respondeu-me. - Agora, as atenções vão para os livros.
Com certa desesperança, confidenciou que gostaria muito de ler "Paula", de Isabel Allende, mas temia que o preço do livro não estivesse ao seu alcance.
Seu encanto pela leitura, disse-me, começara na infância e com "Meu pé de laranja lima", de José Mauro de Vasconcelos.
Bem, de calçados brilhando, fui embora.
Ainda naquela tarde, pude retornar para oferecer a ela, em volume usado, "Paula", da notável escritora chilena.
E aí... brilharam os olhos da engraxate leitora.
Um comentário:
Brilhante!Parabéns!
Pedro e Clara Albath
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