Almiro Zago
Ter em casa gaiola com passarinho,
tempo houve, era assim como manter cachorro hoje em dia, embora não se visse
todo esse interesse comercial que envolve a lida com os caninos. Deveria
escrever pets?
Da infância, vem a recordação de
meus irmãos mais velhos fazendo um viveiro para aprisionar pintassilgos, que,
aos bandos, frequentavam algumas plantas semelhantes ao girassol, de nossa
horta, para se fartarem de sementinhas. Empolgado, participava da colocação de
alçapões para apanhá-los, porém vitimados sempre eram os mais jovens, embora
torcêssemos por algum astuto cabecinha preta. Depois, em sua prisão,
debatiam-se tanto na busca da liberdade que acabavam morrendo. Ah, como isso me
entristecia, embora se achasse normal prender os pequenos alados por egoísta
deleite.
As coisas foram mudando, outra
consciência se formou, chegando-se à mentalidade de proteção. Foram-se gaiolas e
espingardas.
Lembrei-me disso tudo certa manhãzinha
ao acompanhar pousos e decolagens de muitos passarinhos nas árvores
transformadas em pracinha de alimentação do passaredo, perto de meu ponto de
observação.
Num distraído levantar voo, certa
avezinha pardacenta, bico preto, não identificada, pousou na rede de proteção
da janela, sem notar minha presença no lado de dentro da vidraça. Ágil,
perscrutou tudo o que lhe interessava e, num bater de asas, desapareceu.
Pois, naqueles poucos segundos, veja
a ironia, por força da rede imaginei a sensação de estar dentro da gaiola, e o
pássaro em liberdade. Nem quero pensar se a aparição da ave desconhecida queira
dizer de vingança tardia dos pintassilgos mortos no viveiro, mas, ao fundo de
minha consciência, uma luzinha de remorso reacendeu.
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10.10.2015