quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

setembro 2006

quinta-feira, 28 de setembro de 2006

Um mundo novo em dez lições...ou onze!

Isabel Cristina CCarvalho*

Sempre fui uma pessoa que acreditou em intuição ou, ao menos, perseguiu a compreensão deste pressentimento ainda tão mal apreendido pela humanidade. Aliás, eu acredito que a intuição seja uma arma tão poderosa que os próprios donos do poder exercitam esta sabedoria para distinguirem-se dos leigos. Arrisco um palpite de que eles não ensinam a ninguém os sintomas da intuição, para não perderem o atributo que homens de marketing chamam de "diferencial competitivo".

Com minha intuição vivo cada dia como se fosse uma janela a se abrir para uma natureza de "outra" natureza invisível, mas concreta de possibilidades que acontecerão e que eu não devo considerar meros acasos.

Numa destas manhãs gaúchas, cinematográficas, de inverno, vivenciei momentos que poderiam ser denominados: "resultados pela identificação de situações intuitivas". A convite de uma designer de joalheria visitei uma feira de moda, como um dos focos vertentes do meu trabalho. Fiquei surpresa com a presença de mais quatro outros profissionais, desconhecidos entre si, mas próximos a mim, com os quais eu precisava me encontrar. Nossas apresentações promoveram idéias e soluções para o cotidiano de todos e senti-me envaidecida por ter respeitado a minha intuição.

Citei este pequeno exemplo de intuição, apenas para compará-lo com o exemplo de intuição anterior, em série, em capítulos, percebida em dez lições através de nossa oficina de crônicas, realizada neste mesmo inverno cinematográfico, com o escritor Walter Galvani e que me proporcionou um encontro ao cenário das letras, aos meus sentimentos e em novas relações afetivas dentro de uma comunidade que também admira a literatura. E desta vez senti-me feliz por reconhecer, identificar e aprender a não negligenciar meus sentimentos.

Foi muito bom intuir que Karens , Marco Antonios , Fabrícios , Lucianes, Américos e Almiros realizavam suas vontades. Foi ótimo intuir que Camilas e Galvanis confirmavam as suas. E foi melhor ainda intuir que em dez lições era possível fazer um mundo acontecer e permitir-me vivenciá-lo tal como surgisse. Realizei este projeto em um dos momentos mais fragilizados de minha vida e talvez por isso o mais fecundo. Convivi na construção de nossa oficina entre obras e caliças de emoções que emergiram sob formas espontâneas e que transitaram ante as emoções de todos.

Como é gratificante encerrar uma série de lições onde pode caber um mundo inteiro e iniciar outra série, maior ou menor, em capítulos ou em doses únicas e coadunar este novo mundo ao outro nosso, já em curso. Quão bom ficarmos atentos à sinalização da intuição que se manifesta em cada um de nós, em momentos aleatórios e podermos reverenciá-la e realizá-la. E que Dream Team seremos se pudermos perceber a intuição do outro e pegarmos carona em sentimentos sempre... sempre, sempre originais e bem-vindos.

Exercite sua intuição! E depois me conte... ;-)


*Isabel Cristina por Isabel Cristina:
Sou uma mulher apaixonada pela vida, pelas pessoas, pela arte, por nossos projetos e sonhos.
Sou também extremamente curiosa, teimosa e consciente. E adoro ser discursiva e exclamatória!
E em algumas vezes... reticente.



terça-feira, 26 de setembro de 2006

BENÇÃO

Camila Canali Doval*

Se eu quero escrever para sempre? Antes fosse uma questão de querer! Escrever é respirar, é viver, é ser. Escrever é como acordar pela manhã e abrir os olhos: algo inevitável. O tipo de coisa que não dá para escapar. Enquanto existo, escrevo e duvido que esse silogismo perca a lógica tão cedo em minha vida.

Escrever é uma realização íntima. Não importa quem lê ou se lê. A escrita é um desabafo, um consolo, um carinho na alma, uma forma de dizer ao mundo ei, estou aqui e faço parte, de alguma maneira. Não quero dizer que aqueles que não escrevem não participam do nosso aqui e agora. Mas quem escreve, normalmente, sente necessidade de afirmar sua existência, de uma forma toda especial. Escrever é uma maneira que parece tímida de colocar o eu para fora. Os escritores, em sua maioria, soam tímidos. Ledo engano. Escrever, em muitos casos, pode ser agressivo, espalhafatoso, violento. Quando escrevo não peço licença, me atiro, me exponho toda para todo mundo ver. Um vício malicioso. Um exibicionismo enrustido. Poucas coisas são tão excitantes quanto receber elogios por um texto. Uau.

Apesar desse caráter tão pessoal, escrever também é um ato de doação. Palavras enfeitam o dia, a alma, as perspectivas. Palavras fazem pensar. Acrescentam cultura. Desfazem enganos. Colocam pulgas atrás das orelhas. Palavras confortam, animam e divertem os leitores. Palavras pegam pelas pernas e derrubam. Palavras confessam o que muita gente tem escondido a ponto de não conter o rubor. Palavras... Palavras são necessárias ao mundo porque o explicam e nós, humanos, somos os reis das explicações. Palavras, definitivamente, têm grande função social.

E além de tudo isso, escrever é fazer História. Por exemplo: uma crônica sobre hoje, conta o passado de amanhã. Ela registra os fatos, os pensamentos, as tendências, as expressões, os estilos, os desejos, os dissabores, os sentimentos em geral. Uma crônica é um documento histórico. Basta ver a carta de Pero Vaz de Caminha sobre o "descobrimento" do Brasil. Está tudo lá, de uma forma espontânea e sincera, para o rei e todo mundo ler. Às vezes, você acha que está fazendo um textinho à toa, mas na verdade está eternizando uma cena, tal qual uma pintura, uma arte maior. E se bobear, nessa brincadeira de escrever, acaba eternizando a si mesmo.

Respondam como eu poderia, então, não desejar escrever para sempre? Muito mais do que ego, solidariedade ou altas pretensões humanitárias, escrever é coisa que vem direto do coração e nada mais importante do que o coração. Enquanto existirem pessoas que escrevem, o calor estará garantido, as emoções estarão bem cuidadas, os sonhos estarão preservados. A escrita proporciona encontros memoráveis do escritor com ele mesmo, um contato raro, porém fundamental em nossos dias. E gostar de escrever proporciona encontros fantásticos como esta oficina, mais raro ainda e de caráter único, do tipo que dificilmente se repete, que está traçado no destino de determinadas pessoas, especiais, escritoras, abençoadas.

Como eu ficaria fora dessa?

*Camila Canali Doval por Camila Canali Doval: provável escritora, futura mãe de pequenos Caios, moça de família de comercial de margarina, quase formada em Letras, blogueira de plantão, taurina em alto grau (vide defeitos do signo), 26 anos de idade, infinitos de sonhos, incansáveis de busca, repletos de vida. Uma mulher de sardas assumida, apaixonada e feliz até onde pode e, olha, pode muito.


quinta-feira, 21 de setembro de 2006

RECOMEÇO

Karen Scopel*

Palavras, palavras e mais palavras. Foram elas que uniram este grupo, a vontade de aprender a usá-las mais e melhor encontrou abrigo naquela oficina, assim como a gaivota encontra em seu ninho.

O Vôo da Palavra, oficina que tem como gaivota mestre o Professor Galvani, além de abrigo, me encheu de estímulo, me mostrou um novo caminho, novos amigos e proporcionou-me um recomeço do meu caso de amor com as palavras.

Hoje, sou uma filhote de gaivota que está aprendendo a usar as palavras como se estivesse aprendendo a voar. Pretendo manter as asas sempre abertas, voar alto e dar o mergulho mais perfeito que eu puder, tal qual as gaivotas em busca de seu alimento, e depois, vem o mais difícil, segundo Galvani, continuar o vôo e não deixar as "palavras" escaparem.

Antes de me tornar essa pequena gaivota, as palavras estavam em pouco esquecidas, ruminando dentro de mim, mas sem que eu lhes desse chance de aparecer impressas em uma folha de papel. Desde a entrada na faculdade de odontologia deixei de lado os meus escritos e me dediquei somente à profissão que escolhi. Felizmente, senti que era chegada a hora de me lançar em outros vôos e me aventurar pelas palavras. Aqui estou.

Meu reencontro com a palavra iniciou na Feira do Livro de 2005, onde realizei uma oficina com o nosso Professor. Muitos podem se perguntar, o que faz uma dentista em oficinas de literatura? Fácil, busco transformar em palavras os sentimentos que tomam conta de mim no meu dia-a-dia, repleto de obrigações, de tentativas de minimizar a dor dos outros, de solucionar problemas de outras pessoas que, de repente, também se tornam meus problemas e, claro, usar as palavras para me fazer sentir, sentir mais a vida e o seu sentido.

Ler, reler, escrever e escrever fazem muito sentido, assim como a vida que é sempre escrita, lida e relida.

Karen Scopel por Karen Scopel (e por Walter Galvani): Acho que meus textos dirão mais de mim do que eu poderia fazer se tentasse me definir. Então, resolvi usar uma frase do amigo e Professor Walter Galvani, a meu respeito, que eu adoro: "Tem muita humanidade concentrada no pequeno e precioso espaço físico da tua mente e do teu coração".


sexta-feira, 15 de setembro de 2006

A FERTILIDADE DAS PALAVRAS...

Luciane Dalbosco

Minha filha Laura, de seis anos, além de adorar pular em cima da minha cama, é pós-graduada em pré-escola. Aos dois anos entrou no maternal, aos três cursou o jardim "a", aos quatro, o jardim"b", aos cinco foi para um colégio e completou o pré "a" e agora, para finalizar o ciclo, está no pré "b". Ela domina um pouco de tudo, sua convivência com os coleguinhas de aula e a obrigatória circulação entre adultos lhe oferece subsídios para opinar e, até mesmo, questionar procedimentos. Ela é responsável, e a novidade do pré "b" são os temas de casa. Toda a sexta-feira lá vem ela com uma folha de papel que deve ser devolvida na segunda.

Numa destas sextas o tal "tema de casa" me causou preocupação. Ao contrário das habituais figurinhas para pintar e letrinhas para copiar, a tarefa apresentava 23 quadrinhos, cada um com uma letra do alfabeto onde a criança deveria fazer um desenho correspondente.

A primeira era a letra "A". Olhei de canto de olho e fiquei imaginando como a Laurinha iria desenhar uma abelha. Puxa, isso não seria uma tarefa fácil. Durante estes instantes, para dar uma disfarçada, fui até a cozinha fazer qualquer coisa que nem lembro mais. Quando retornei, observei que vários quadrinhos já estavam completos e imediatamente perguntei, sem olhar para o quadrinho específico, sobre como ela tinha conseguido desenhar uma abelha na letra "A". Com tranquilidade ela me informou "mãe, não desenhei uma abelha, desenhei uma árvore."

O alívio e o orgulho que tomaram conta de mim neste instante são indescritíveis. Minha filha de seis anos, despida de preconceitos visualizou uma árvore como sua representante da letra "A", enquanto que eu só conseguia enxergar uma abelha.

As palavras são férteis, não pelo que expressam, mas pelo que podem causar.


terça-feira, 12 de setembro de 2006

O Eleitor da Triste Figura

Marco Antonio Saretta Poglia *

Dom Quixote de la Mancha mal havia se armado cavaleiro quando enfrentou sua primeira aventura: salvar um rapaz de quinze anos que se encontrava amarrado a uma azinheira, sob os açoites de um lavrador. Sucedia que o rapaz era seu criado, e esse era o castigo pelo descuido com as ovelhas que ficara encarregado de cuidar e pelas reclamações de seus pagamentos. Resumo da história, o cavaleiro só saiu satisfeito depois de, sob grandiosas ameaças, fazer com que o lavrador jurasse pela Lei da Cavalaria que deixaria o pobre rapaz e lhe pagaria o devido. E tão logo foi-se embora o "desfazedor de agravos", o lavrador tornou a espancar, com ainda mais veemência, o rapaz descuidado. Acontece que Dom Quixote havia se tornado cavaleiro depois de perder o juízo em meio a tantas leituras de romances de cavalaria, que já não mais distinguia o mundo real daquele narrado nos livros de Amadis de Gaula e tantos outros. E assim lhe parecia muito improvável o descumprimento de um juramento perante as leis da cavalaria.

Depois de muita pressão, abaixo assinados e campanhas pelo voto aberto no congresso, foi enfim votada na Câmara dos Deputados, na última terça-feira 5, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 341 de 2001. De autoria do deputado Luiz Antônio Fleury (PTB-SP), a proposta extingue o voto secreto em todas as casas legislativas do país. Trata-se de uma questão de fundamental importância para a nação. Se um parlamentar é eleito para representar o povo, como poderá fazê-lo às escondidas? Chega a ser irônico. Não podemos cair na ilusão do personagem criado por Cervantes há mais de quatro séculos! O voto secreto isola o parlamentar das pressões da sociedade, deixando-o livre de prestar contas sobre sua atuação. Assim, passa a legislar por debaixo dos panos. E acabar com este dispositivo não envolve custos, apenas vontade política.

Diante da péssima imagem que se apresenta o congresso brasileiro, a PEC foi aprovada em primeiro turno. Segundo informado pela imprensa, o quórum necessário de três quintos dos 513 parlamentares para validar a votação só foi alcançado depois que os deputados do PSOL e do PPS ameaçaram divulgar na internet os nomes dos parlamentares que se ausentassem (lembrando que esse tipo de votação ocorre em regime aberto). O exemplo já basta para provar a importância de se acabar com o voto secreto no congresso nacional. Quanto ao eleitor, este sim necessita estar protegido de eventuais pressões que possa sofrer. O seu voto é uma decisão pessoal, onde escolhe alguém para lhe representar (e o eleitor responsável precisa - e deve! - acompanhar de que maneira isto está sendo feito). Justifica-se, nesse caso, a realização de votação secreta. Ademais, segundo Barão de Itararé, "só assim, afinal, o eleitor não terá vergonha de votar no seu candidato". O fato é que não há nenhuma razão lógica para a permanência do voto secreto no congresso. Ponto final.

Pois é. Mas ainda tem gente fazendo promessas às leis da cavalaria! Por se tratar de uma PEC, deverá ser votada em dois turnos, na câmara e no senado. E a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do senado já aprovou texto substitutivo à proposta, restringindo o fim do voto secreto apenas às votações de cassações de mandatos parlamentares. Está na hora do povo brasileiro impedir que esses parlamentares continuem a legislar em causa própria! Cabe a nós, cidadãos eleitores, fiscalizar aqueles que estão empenhados em nos retirar o direito de saber como conduzem a faculdade que lhes delegamos de nos representar, identificando seus nomes e partidos. Lembre-se disso dia primeiro.

* Marco Antonio Saretta Poglia por Marco Antonio Saretta Poglia:
Eu sou apenas um rapaz latino-americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior. Tenho ouvido muitos discos, conversado com pessoas, caminhado meu caminho...



sexta-feira, 8 de setembro de 2006

ABACATEIRO DE PENSÃO

Américo Conte*

Sobre velhas telhas encardidas
atapetadas por musgos e liquens,
estendem-se galhos e folhas carcomidas
de um abacateiro de pensão.

Testemunho único de um rodízio de vidas
que se instalam em uma hospedaria do tempo,
de passagem a sonhos e metas preestabelecidas,
carregando na bagagem uma igual situação.

Fuxicos e fofocas não se contam mais em pauta
ante tantos outros fatos que já presenciou.
Bebedeiras, brigas, roubos e mesmo um simples tocar flauta
são coisas que auxiliam a um acumulo de tensão.

Desconfianças e despejos são jogos que prevalecem
numa casa de regras estabelecidas,
onde, às escondidas, sexo também acontece,
permitido que é em palavras, mas proibido em ação.

Porém não são só desavenças e entradas pelo cano,
alegrias esfuziantes por vezes os enaltecem,
principalmente no Natal e festas de fim de ano
confraternizam-se em sentimentos de grande comoção.

E o abacateiro quase esquecido e maltratado
possui seus momentos de atenção, pelos inquilinos,
que afirmam deveria ser ele cortado,
cedendo lugar a outra árvore, de melhor aproveitação.

Todavia ele exerce seus serviços no quintal.
Além de poste onde o cachorro fica amarrado
é também o suporte de um dos lados do varal
sendo, aos donos do local, imprescindível sua função.

Todos os anos, aos moradores, acalenta esperanças
quando frutinhas em seus galhos, brotam em abundância,
entretanto sucumbem, feito raquíticas crianças,
sobrando apenas algumas de duvidosa degustação.

Época difícil, em que só escuta injúrias,
tendo como único amigo o cachorro
que enroscado aos seus pés lhe confidencia lamúrias,
compartilhando a amargura de nunca poder ter razão.

Adubos e bons tratos, nunca a ele se destinam,
só o lembram como escada, para o consertar de telhas,
e o amigo confidente sempre em sua base urina...
Perdoa-o, pois sabe que na vida não existe perfeição.

Ciente de que um dia irá chegar o seu fim,
deixou de se aborrecer e se inconformar com o destino,
pois aprendeu que as pessoas continuam sempre assim,
uns tempo uns, outros, outros, conservando suas humanas condições.

*Américo Conte por Américo Conte:
Sou Américo Conte, nascido sob o Signo de Touro, com Ascendente em Áries e Lua em Capricórnio, amante em primeiro grau das Artes nas sua mais diversas manifestações, como a pintura, desenho, cinema, teatro, poesia, literatura e a música em seus mais diversos estilos e ritmos. Amo os animais, de preferência os mamíferos e as aves. As plantas também estão em minhas mais altas considerações. E, as pessoas, é lógico que não gozam do mesmo prestígio, a não ser aquelas humanizadas e de boa índole e caráter. As opressoras, mal intencionadas, dissimuladas e intransigentes, eu quero é distância. Coloco aqui aspectos suficientes para vocês terem um bom conhecimento a meu respeito, bem mais do que aqueles registros sociais que nada elucidam. Sem mais desejo sucesso e felicidades a todos que de uma certa forma se identificarem comigo.



terça-feira, 5 de setembro de 2006

DOCE INVASORA

Almiro Zago*

Sempre gostei de escrever. Quando jovem ainda, na atividade de radialista, além de falar e ler ao microfone, escrevia textos de publicidade, programas, notícias. Isso me fascinava.

Mais ou menos na mesma época, sendo, então, estudante de direito, editei um jornalzinho que ao todo não teve mais de uma dezena de edições. E, num jornal que saía aos sábados, escrevi uma pequena coluna de destaques universitários.

Na corrida do tempo, de vez em quando batia a vontade de escrever algo mais. E talvez porque fossem leves as batidas, ficava só nisso. Passados uns bons anos, e aí, por mudança de atividade profissional, da linguagem jornalística e publicitária, passei para a jurídica.

E continuava a sentir vontade de escrever. Então, faltava tempo. Mas chegou o dia em que a agenda ficou povoada de espaços em branco, provocando determinação mais firme de escrever, de criar, produzir alguma coisa.

Agora, além das óbvias dificuldades a superar, a linguagem literária ou mesmo a jornalística não apareciam. Assim, uma narrativa com singela pretensão literária ficava mais parecida com escrito jurídico. Freqüentemente, os textos, para minha decepção, lembravam criaturas do doutor Frankenstein.

E eu escrevia. E apagava. Se fosse em papel de máquina de escrever, teria comprometido a renda familiar com o prejuízo.

Bem, de certa feita, ouvi no rádio, alguém repetir antiga frase: o homem só é completo se faz um filho, planta uma árvore e escreve um livro. Foi aí que me animei. Tenho filhos, plantei árvores. Eh, só me falta o livro. Só o livro?

De qualquer forma, senti alguma coisa diferente, uma provocação beliscando o ego. Parei de tanto deletar, na medida em que a salada de linguagens vinha reduzindo os ingredientes.

Pois foi assim que me vi diante de uma coletânea de textos de oitenta páginas, corpo 14, do meu computador. Depois de uma crítica familiar, uma correção aqui, uma alteração ali, os escritos iam ganhando alento. Assim mesmo, não me sentia convicto, nem seguro de que tivesse suprido o terceiro elemento para completar-me como homem.

E o tempo passando. Aconteceu que, numa folga da autocrítica, furtivamente, mandei por e-mail os textos a um editor. Fiquei sabendo, então, que a coletânea alcançaria mais de 170 páginas em livro. Foi um susto, claro, pelo custo da edição. Não apenas isso. Afogado num mar de dúvidas quanto à qualidade, deixei o editor aguardando a resposta.

Nessa aflitiva passagem, esperava por uma tábua de salvação. E que chegou firme e a tempo: a Oficina de Crônicas "O vôo da palavra", de Walter Galvani.

Eis a razão de estar aqui, descobrindo as fontes e os pontos de referência visíveis para orientar os passos neste caminho cheio de traiçoeiras curvas, que é o de aprender a escrever bem.

Estão aí os desafios. Se a leitura é o canal, como insiste o mestre, devo ler muito. Ler e escrever todos os dias. Sei, vai ser dura a lida com a preguiça, a dispersão e tantas coisas mais. Todavia, "Galvani inspira", proclama Fabrício Carpinejar. E anima com a clareza de suas lições e o talento estampado nas suas crônicas e de outros bons autores.

Aqui, a palavra é fascínio, é mistério e revelação. Entretanto, receio um caso de amor com a palavra. Mas como descobri-la, conhecer-lhe o íntimo significado, acariciar-lhe as formas, com ela planar sobre as águas sem amá-la?

Pena que essa declaração amorosa não apague suspeitas de um certo vazio... Não o confirmo, nem desminto. Seja lá como for, a Oficina de Crônicas, essa doce invasora, vem cuidando da ocupação do espaço.

O mar de dúvidas? Ah, virou um lago de águas mansas por onde divagam os pensamentos na faina de burilar as palavras e colorir os textos da coletânea. E, claro, afugentar os monstrinhos "frankensteinianos".

*Almiro Zago por Almiro Zago:
Sou, apenas, um caminhante.
Pedi pouso aos "Mecânicos da Palavra"
só para me encantar com os novos caminheiros
que vieram se agregando ao longo da estrada.

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